Camuflagem.

Sempre que não penso primeiro em mim, me arrependo. Mas, tenho que aprender a não pensar somente em mim, nem que seja, de forma camuflada. Afinal, as relações necessitam de doação, de entrega, de um abortamento de egocentrismos e de egoísmos. Fato: preciso pensar nos outros também, e sempre.

Não entendo, então, o esgotamento de energia que sinto, toda vez que me entrego demais, faço planos, nem que sejam apenas mentais e, um simples movimento ao contrário, de estar 'dando trabalho', de estar 'cobrando' coisas, como presença, doações à minha pessoa, sentimentos, entregas, me exaspera e sinto vontade de me enfiar de novo debaixo das minhas cobertas sozinha e nunca mais me ver em outra situação, que não seja, SOZINHA. 

É que sozinha, eu não preciso perpetuar desejos, movimentos de caminhadas a dois, de auxílios mútuos, de acontecimentos a dois felizes e portentosos, até. Os prazeres se amontoam em cima apenas de mim, os vasos ficam cheios de flores apenas para mim, os sussurros são abafados e restam apenas os meus bocejos, de sono e de tédio. Não, eu não quero que desfaçam planos por minha causa, que abortem desejos, que vomitem ou regurgitem sabores, apenas porque eu não quero ir até o prato principal. Ao mesmo tempo, quero. E fico mal por isso.

Mas eu regurgito, eu vomito, eu deixo, eu evito, eu refaço caminhos, eu repenso planos, eu deixo de ir, eu domestico meus bichos, ou redomestico, para que, caseiros, não forcem do outro caças que só eu desejo caçar, ainda. E se torna fácil demais prá mim isso, visto que encaro um dia após o outro como 'o dia de prazer'. Mas, me arrependo, se vejo que é só a entrega obtusa do momento, e, não posso 'exigir' que os outros façam isso também.

Aí o caminho de volta fica tenso. Aprendo também, junto com 'o dia de prazer' a recuar, esperar sempre menos, não acreditar tanto em palavras soltas. Aí vem todo um esquema de voltar a pensar SÓ EM MIM, correndo, de novo, o alto risco de ir esquecendo DO OUTRO. É um processo libertário, mas, extremamente idiossincrático e subjetivo. Não gosto disso e, o medo toma conta do outro, quando, na caminhada, a ameaça começa a soltar suas garras. E começa o meu processo de camuflagem, que só eu entendo, e sei, e uso. E ninguém jamais vai entender.

E fico repetindo prá mim mesma que eu sou única, eu sou estanque, que ninguém pensa como eu, mas, devo estar também enganada. Os outros querem um pouco sempre dos outros também, e de mim. Se eu voltar a ser egoísta, e coisas do gênero, talvez nem existissem as pessoas tantas que dizem me amar, em volta. Penso que valha a pena doar sem camuflagens, sujeirinhas embaixo do tapete, apenas para viver as relações com felicidade. Porque a felicidade é hoje. E existe, sim. A dois, no caso.

Eu preciso pensar primeiro em mim, apenas para não saber-me só e aprender a estar com os outros, com a cabeça livre de sentimentos ruins, ou, no cerne das questões, não cobrar nada, principalmente de quem não tem o dever clássico de me dar, nem de me proporcionar nada. E não estou falando de coisas materiais, nunca falo nisso. Falo de sentimentos, de paz, sempre. Sem camuflagens.

Dentro, aflição. Fora, sorriso. Camuflagens à parte: operação pensar em mim, sempre.

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