|E se eu só olhar?


Tão bom quando alguém entende o que você quer dizer, antes de você dizer. Tão bom quando você abre a boca e diz alguma coisa e alguém sabe que não é aquilo que você gostaria mesmo de dizer. Tão sensacional quando o olhar fala mais do que horas e horas de palavras soltas ou amarradas. Tão bom quando alguém imagina o que você está pensando, facilitando, assim, a movimentação em torno do que precisa ou deve acontecer, e acontece sem que palavras sejam ditas.

Da mesma sorte, quão maravilhoso é quando pessoas simplesmente entendem que você não as deseja por perto e somem da sua vida, respeitando esse seu desejo. Ou, um simples olhar reprovador, por estar num mesmo ambiente, ou um movimento de indiferença, faz com que esse desejo de afastamento se mostre mais forte e fatal. De uma forma ou de outra, acho incrível quem tem a sensibilidade, perspicácia e sagacidade de entender as entrelinhas das coisas e situações.

Não é todo mundo que tem essa sagacidade e eu preciso entender isso de uma vez por todas. Ainda espero, até de forma ingênua (sim, ingênua), que alguém me entenda, antes de eu dizer. Que entenda o meu olhar, meus trejeitos, meus sorrisos, meus olhares, meu tom de voz, meu arrastar de correntes, minhas meias palavras, meu discurso de horas. Mas, não entenda apenas o gesto em si, mas as entrelinhas do que está acontecendo, no contexto mais especial do momento.

Talvez eu fale horas, só para tê-lo perto, mais perto e não pelo assunto em si. Talvez eu ligue no meio da tarde, doentinha, perguntando como você está, só para 'ouvir um dengo' e, quem sabe, um arroubo desesperado de vir cuidar de mim, mesmo sem poder e eu saber que não vai poder. Quem sabe eu sorria, mas esteja odiando, ou apenas ironizando. Quem sabe eu chore, mas de amor, emoção. Quem sabe eu não diga nada, mas meu olhar já disse tudo que eu queria dizer e ele mesmo falou por horas a fio, num olhar de um segundo apenas.

O tempo vai revelando e ampliando essa prazerosa simbiose. E eu fico me debatendo, tentando antecipa-lo em algumas pessoas, cortando as juntas da naturalidade, depois, me auto-flagelando. Naturalmente me pego olhando de formas diferentes, para algumas pessoas que começo a conviver, para ver se elas 'entendem ' o que quero 'dizer'. Me pego dando tiros no pé quando a carência bate e eu suplico atenção, depois de jogar todas as armas de sedução sutis e, infelizmente, não ser entendida. E mais, ser realmente mal interpretada, como alguém que está com melindres.

O outro esquece em como desperta em você a simbiose, em como já desenvolveram uma intimidade tal que  dá o desejo de infiltrar coisas assim, transbordando sensibilidade, carinho, simbiose, amor, troca de energia, sintonia fina, etc. Pode ser natural, mas também pode ser adquirido, desenvolvido. Uma amiga que tive sabia quando eu estava feliz, apenas pelo modo como eu sentava. Meu ex marido sabia que quando eu balançava o pé, sacudia com rapidez, é porque eu estava muito, mas muito zangada.

Quero ir deixando cada vez mais as palavras de lado, a verbalização, a oralidade e conseguir alcançar a delicia de ser entendida e entender mais o que o corpo fala, também o que há nas entrelinhas, principalmente do que vem da parte dos que eu amo: As ações, as reações, o contexto, um ato ali, isolado, mas que pode ter um significado imenso, quero entender para que eu possa me antecipar em satisfazer os seus desejos, acarinha-los, guiá-los, sem precisar muita coisa. Vai ser bom, vai ser bem melhor.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

'...todas as cartas são...'

Poema declaratório.

Infame.